Quem eram os Fariseus?
Muito se ouve sobre os Fariseus. Certamente é um
grupo de destaque em todo o Novo Testamento, mas não carregam uma boa
reputação. Vemos, quase sempre, um conflito intenso entre o Salvador e esse
grupo tão religioso e legalista, mas pouco se sabe sobre detalhes relativos à
origem, organização e atuação política do grupo. Esse texto tem como objetivo
trazer algumas informações importantes para a melhor compreensão da história
desse grupo, bem como trazer luz sobre como eles se relacionam com as verdades
expressas no NT.
As fontes de informações são reduzidas. Somente três
documentos trazem maiores informações: a Mishná[1], o
Novo Testamento e obras de Flavio Josefo. Este último foi um historiador judeu
que viveu no primeiro século e apresentava-se como fariseu. De acordo com
Josefo, os fariseus já figuravam em Israel por volta de 145 a.C, já outros
historiadores apontam como herdeiro dos “hasidins”(significa “leais a Deus”).
Estes, por sua vez, foram sucessores da obra de Esdras e ao longo dos anos
ofereceram forte resistência a paganização da religião judaica, especialmente
quanto a sua helenização. (Tognini, 2009)
Brown e Coenen (1998) dizem que, apesar de se saber
que “fariseu” significar “separado”, não se pode ter certeza quando a origem
desse termo, apontando, então, três teorias bem comuns:
a)
Descendência dos
hasidins que, no passado, foram
aliados dos Macabeus, contudo, depois, foram ‘separados’.
b)
Descendência dos
confederados. Um grupo que, em 135 a.C, se separou do restante do povo que não
guardava a lei.
c)
Jogo de palavras
judaicas que, misturadas, traduzia-se por “separação”.
Não se pode considerá-los um partido político,
apesar da imensa força política que conquistariam ao longo dos anos. Abdicaram
do uso da violência no período dos hasmoneus e ganharam muita popularidade
entre a classe mais humilde (enquanto seus rivais, os saduceus, conquistaram a
amizade da classe mais rica). Vários homens da classe média baixa faziam parte
desse grupo, identificado especialmente, pelas crenças comuns e o zelo
religioso. Eram organizados e possuíam uma hierarquia específica. Daniel-Rops (2008)
diz que “a organização deles pode ser perfeitamente comparada com a de um
partido político moderno num estado democrático de direito”.
Crenças
Eram considerados “liberais” no relacionamento com a
Lei, pois consideravam como lei de Deus tanto a Torá como a tradição oral e os
ensinamentos dos mestres. Acreditavam que a Lei se formava ao longo do tempo,
ganhando novas interpretações de novos mestres. Daniel-Rops (2008) salienta que
eles têm sido chamados de “tradicionalistas”, mas essa designação só faz
sentido se a palavra tradição for entendida como lei oral.
Gostavam de observar os detalhes da Lei. A “Halacá”
(corpo de decisões jurídicas que interpretava a Torá) era considerada tão
obrigatória quanto à própria lei. Praticamente todas as áreas da vida humana
eram reguladas por aplicações da Lei. Em Atos 1.12, por exemplo, fala sobre a
“jornada de um sábado”, isso remonta a uma aplicação farisaica que estabelecia
que um judeu não poderia andar, num sábado, mais do que mil passos. Caso o
fizesse, estaria violando a lei. Possuíam 613 mandamentos, sendo 248 negativos
e 365 positivos. Valorizavam mais as tradições acrescentadas a lei do que os
princípios divinos vinculados a ela. (Tognini, 2009)
As principais doutrinas dos fariseus
eram:
1. Livre-arbítrio do homem, assim criado
por Deus.
2. A alma é imortal. Após a existência
terrena, continua vivendo e nunca morre.
3. A ressurreição do corpo (At 23.8).
4. A existência de anjos (At 23.8).
5. Todas as coisas são dirigidas pela
providência divina. 6. No mundo além, os justos serão recompensados e os maus
castigados.
7. Os maus serão presos em cadeias
eternas, enquanto os justos desfrutarão a vida eterna.
8. Além da alma humana, existem outros
espíritos: bons e maus.
Com o passar dos anos e o crescimento do grupo,
divisões foram surgindo e escolas com pensamente divergente foram criando forma
dentro do movimento. As mais significativas foram as escolas de Hillel e
Shammai. Esta última tinha uma visão mais estrita e detalhada da lei, já a primeira
era bem mais ampliada e flexível na aplicação. Conta-se que, certa vez, um
judeu pediu que Hillel explicasse toda a lei enquanto conseguisse ficar e pé
numa única perna, ao que o mestre respondeu: “o que é desagradável para ti não
faças a teu próximo: esta é toda a lei. O resto é comentário.”
Jesus e os Fariseus
É sabido por todos que os Fariseus foram os maiores
opositores de Jesus ao longo do seu ministério terreno (Mc 3.6; 12.13; Mt
12.14; Jo 3.1). Em várias situações eles testavam ou provocavam o mestre para
“apanhá-lo em algum erro”, sempre sem sucesso. Cristo, de igual modo, não
poupou críticas ao grupo, chamando-os de hipócritas, raça de víboras, dentre
outros adjetivos negativos.
Contudo, David Cloud[2]
nos lembra que é importante notar que Jesus Cristo NÃO repreendeu os fariseus
por seu zelo em obedecer os detalhes da lei (Mt 23:23). Porém, Ele os
repreendeu:
(1) por suplantar a Palavra de
Deus com tradições feitas por homens e assim tornar sem efeito a Palavra de
Deus (Mt 15:1-9);
(2) por rejeitar a Jesus Cristo (Mt 12:22-24);
(3) por perverter o Evangelho (Mt 23:15);
(4) considerarem-se como se fossem justos e perfeitos (Lc 18:9-14); e
(5) por pesada hipocrisia (Mt 23:23); Mc 12:15; Lc 12:1).
(2) por rejeitar a Jesus Cristo (Mt 12:22-24);
(3) por perverter o Evangelho (Mt 23:15);
(4) considerarem-se como se fossem justos e perfeitos (Lc 18:9-14); e
(5) por pesada hipocrisia (Mt 23:23); Mc 12:15; Lc 12:1).
Além disso, a Bíblia mostra que Cristo manteve
contato com alguns do grupo e, inclusive, aceitou convite para comer com eles
(Lc 7.36; 11.37). A relação tensa se deu pelo fato de o grupo era, em quase sua
totalidade, cheio de orgulho e havia distorcido os princípios da lei e fez da
mesma um fim por si só.
No Dicionário Internacional de Teologia do Novo
Testamento (ver referências) encontramos uma citação interessante, vejamos:
“Para os
fariseus, Deus é primariamente Aquele que faz exigências; para Jesus, Ele é
gracioso e compassivo. Naturalmente, o fariseu não negava a bondade e o amor de
Deus, mas para ele, estes se expressavam na dádiva da Torá e na possibilidade
de se cumprir aquilo que ali se exige (...). A tragédia era que os fariseus buscavam
a Deus de um modo sincero, mas, por causa de um certo conceito particular de
Deus ter se endurecido na tradição deles, fizeram sua decisão contra Jesus.”
Precisamos,
portanto, entender que há atitudes desse grupo que são bastante positivas, a
despeito das críticas, e que seu fervor religioso foi algo que moldou o caráter
judaico ao longo dos séculos e ainda influencia muito alguns grupos mais
ortodoxos hoje. Sobre isso, Russel (2007) diz: “os fariseus criaram um espírito
de verdadeira piedade e devoção que afetou profundamente as vidas das pessoas,
e desenvolveram um individualismo religioso que deu uma nova relevância à
Torah de Deus." Assim, o evangelicalismo pode aprender sim com o
farisaísmo, tanto com seus exemplos positivos, como com os negativos.
Referências Bibliográficas
ALMEIDA
JÚNIOR, João L. Os Grupos Religiosos
Hebreus Surgidos no Período Pós-Macabaico relatados no Novo Testamento: o
dia-dia dos Fariseus, Saduceus, Zelotes e Herodianos. Monografia. Seminário
Teológico Batista do Sul do Brasil. Rio de Janeiro, 2008.
BROWN,
Colin; COENEN, Lothar. Dicionário
Internacional de Teologia do Novo Testamento – volume 1. 1ª Edição. Vida
Nova, 1998.
DANIEL-ROPS,
Henri. A vida diária nos tempos de
Jesus. 3ª Edição. Vida Nova. Aão Paulo, 2008.
RUSSEL,
David S. Entre o Antigo e o Novo
Testamentos: o período interbíblico. 2ª Edição. Abba Press, 2007.
TOGNINI,
Enéas. O período interbíblico: 400
anos de silêncio profético. 1ª Edição. Editora Hagnos. São Paulo, 2009.
[1]
Obra judaica contendo uma compilação da tradição oral.
[2]
CLOUD, David. Esses Fariseus
Fundamentalistas. Disponível em: http://solascriptura-tt.org/SeparacaoEclesiastFundament/EssesFariseusFundamentalistas-DCloud.htm.
Acesso em 10 de Julho de 2017.